Por Leonardo Boff
Mais que resposta a problemas a Igreja mesma é um problema. No século XVI com a Reforma protestante dilacerou-se o corpo da cristandade e na Igreja criou-se um problema: entre tantas Igrejas, qual é a verdadeira? Para reafirmar-se, organizou uma defensiva chamada Contra-Reforma. A partir do século XVII com o despontar da razão crítica e da secularização, agravou-se o problema da Igreja: tem sentido ainda a religião, a revelação e a Igreja? Novamente para defender-se, organizou outra defensiva contra o mundo moderno. Os dois processos ocasionaram uma excessiva centração da Igreja sobre si mesma e assim sua marginalização do curso da história. O Papa João XXIII que tinha enorme bom senso captou o equívoco da defensiva. E também foi suficientemente humilde para perceber que sozinho não poderia fazer um acerto de contas, sem dividir a Igreja. Convocou os bispos do mundo inteiro, reunidos no Concílio Vaticano II (1962-1965) para encontrar juntos uma resposta positiva. Em consequência a Igreja se entendeu a si mesma como Povo de Deus, viu a necessidade do diálogo ecumênico com as Igrejas e com as demais religiões e a urgência do mesmo diálogo com o mundo moderno, valorizando suas principais conquistas. Nasceu um novo rosto da Igreja moderna. É a Reforma Católica que tanta esperança e vida nova tem suscitado pelo mundo afora.
Entretanto, em todos os processos de mudanças há sempre resistências e oposições. Elas predominaram naquelas Igrejas que eram perseguidas como na Polônia e em setores importantes da Cúria vaticana, notoriamente conservadora.
Desta área veio o Papa João Paulo II. Com ele começa uma Contra-Reforma contra a Reforma Católica. Retoma o conceito de Igreja fundamentalmente como Hierarquia. Reafirma que as outras Igrejas não são propriamente Igrejas, tendo apenas elementos eclesiais e sustenta que a Igreja é a única religião verdadeira e que os professantes das religiões do mundo estão em grave risco de salvação. É o conteúdo essencial do documento Dominus Jesus do ano 2000 publicado pelo Card. Ratzinger e aprovado pelo Papa. O coração ecumênico continuou organizando encontros cordiais, mas a cabeça fundamentalista criou um sentimento avassalador: a Igreja Católica não muda mesmo e conserva sua arrogância fundamental. Este fechamento se manifestou em quase todos os âmbitos, na administração da Igreja, na doutrina, na moral especialmente no que se refere à sexualidade e à mulher. O Pontificado de João Paulo II significou um longo hiato no processo de atualização da Igreja. Foi uma tentativa de voltar ao modelo anterior, da Igreja bastião de verdades ao invés da casa de janelas e portas abertas a todos de boa-vontade.
O desafio nestes dias é este: irão os cardeais escolher um Papa que retoma a Reforma Católica do Concílio Vaticano II com as contribuições das Igrejas do Terceiro Mundo que deram centralidade aos pobres e à justiça ou um Papa que prolonga a Contra-Reforma, com o uso da dramatização mediática, da centralização na figura do Papa e na Cúria, com um discurso apenas moralizante sobre os pobres e a justiça? Pouco importa o Papa, o que importa é que tenha o bom senso de um João XXIII e convoque um concílio de todas as Igrejas para juntas darem uma contribuição sem arrogância às graves questões da humanidade. Que o Espírio os ilumine.
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